Domingo! Dia em que a comunidade e cada um de nós - reunidos na fé- temos chance de repor as energias espirituais. Talvez um tanto abaladas expostas à mentalidade egoísta e corrupta que nos rodeia e de algum modo nos contamina. Aos domingos celebrando a força da ressurreição de Jesus acalenta-nos a confiança na vitória de seu poder. O esquema do mundo moderno, competitivo e massificante, cria problemas para a nossa fé. Dificulta a vivência religiosa. Mancha o comportamento ético cristão em projetos, negócios e relações. Aí chega o domingo e renova os apelos do Evangelho. Na missa, no culto, na oração, na reflexão da Palavra de Deus recuperamos a identidade com Jesus. A Eucaristia participada com vivo interesse estreita entre nós laços da caridade, refaz a solidariedade. A mesa eucarística do altar é um porto feliz, aconchegante e acolhedor onde nos refugiamos. Ficam para trás as ondas tempestuosas da semana: os perigos, tentações e armadilhas da sociedade consumista. Aportamos com Jesus. Ele está no barco de nossa vida e sua paz volta conosco para casa.
É comum aludir às “tempestades da vida”. É como se navegássemos num mar revolto ou estivéssemos sujeitos a forças incontroláveis aqui e ali. A linguagem é poética, mas a realidade não o é. Marcos escreveu sobre uma tempestade enfrentada pelos discípulos com Jesus. Mas, não é literatura. É a narrativa de um milagre do Mestre que a tradição das comunidades cristãs conservou desde o tempo dos apóstolos. E que retrata uma experiência comum em tempos difíceis. Leia: Marcos, 4, 35-41.
Este episódio está inspirado em passagens bíblicas do A.T. Principalmente no livro de Jonas. Na Bíblia, aliás, o mar revolto é símbolo do caos, da ameaça, do perigo eminente onde só Deus com seu poder restabelece a ordem e a segurança. Ora, Jesus é apresentado com o poder de Deus. Isso era muito consolador para os primeiros cristãos viverem a fé. Não lhes era fácil conviver em meio à gente pagã e a costumes imorais. Em muitas situações podiam se comparar aos apóstolos temerosos do naufrágio naquela barca joguete das ondas agitadas, enquanto “Jesus dormia tranquilo recostado sobre um travesseiro”.
Reler a narrativa ajudava a comunidade cristã a compreender seu relacionamento com Jesus. É uma narrativa recheada de simbolismos. A barca onde Jesus descansa enquanto seus discípulos remam com esforço, simboliza a própria Igreja. O sono tranquilo de Jesus paralelo à preocupação deles é símbolo da sua confiança total no Pai. Apavorados com o naufrágio iminente os apóstolos recorrem: “Mestre, estamos perecendo e tu não te importas?” Esta cobrança simboliza a falta de fé em Jesus. Eles ainda não conheciam aquele que pensavam seguir. É preciso conhecê-lo a fundo para segui-lo! Por isso, Jesus lhes devolve a cobrança ao serenar a tempestade: “Ainda não tendes fé?”.
E nós hoje? Também temos medo. Não confiamos. Impressiona-nos a rejeição ao trabalho da Igreja e ao seu ensino. Criticada e incompreendida até nas denúncias contra as injustiças e desigualdades sociais. A crise é assustadora. Por todos os lados: corrupção moral, política, ambição de poder, desrespeito à vida. Por todos os cantos do País: miséria, fome, doença, descaso com a saúde pública, exploração, violências. E quanto mais dinheiro e poder concentrados em mãos poderosas (e ágeis...) tanto maior a impunidade beneficiando agentes inescrupulosos. Altos cargos públicos na Câmara, Senado, Tribunais superiores do País, dão guarida a interesses pessoais como salários extras; privilégios, mordomias, emprego de assessores e parentes etc. Se o domingo celebrado na Igreja é ‘porto na tempestade’ “acordemo-nos” de nossa omissão na vivência da comunidade. Refugiemo-nos nela. Não nos abata o desânimo nem o medo. Sejamos perseverantes.
Seguindo o exemplo de MariaNão é gratuito pensar que Nossa Senhora agasalhou Jesus como um barco em meio às tempestades. Pensemos no próprio anúncio da Encarnação quando a Virgem “perturbou-se” com um futuro que lhe parecia tão incerto. E depois acolhe o “filho do Altíssimo” com o “sim” da fé na Palavra. Pensemos no nascimento na gruta e na fuga para o Egito. Nesses episódios bíblicos, a mãe viveu a angústia humana e ao mesmo tempo depositou total confiança no agir de Deus. Ao longo da vida familiar em Nazaré e do ministério público de Jesus, a Mãe foi mãe: preocupada com o que acontecia e com o que diziam de Jesus. (Marcos, 3,31). Atravessou com Ele as águas revoltas da incompreensão do povo e da rejeição das autoridades. Com toda razão uma das antigas invocações marianas a invoca: Estrela do mar rogai por nós! Olha para a estrela e invoca Maria! (São Bernardo de Claraval).
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